Andrés D’Alessandro se despediu do Cruzeiro após o término do Campeonato Brasileiro. Ele decidiu voltar a Porto Alegre para ficar com a família, mas vai continuar no futebol. Em entrevista à Globo, o ex-jogador falou sobre os planos para o futebol e a experiência na SAF de Ronaldo Fenômeno.
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D’Alessandro contou que estava se sentindo sozinho em Belo Horizonte, distante da família, residente em Porto Alegre.
- Foi difícil. A gente coloca em risco algumas coisas. Sempre que mudei de clube, na Europa, Argentina, Brasil, sempre levei a família. A gente concentra muito, mas sempre a família tá em casa. Esse ano foi diferente. Chegava em casa e estava sozinho. Isso foi difícil. Mas esse desafio de não estar com a família não volta a se repetir – garantiu o ex-jogador.
D’Alessandro exercia o papel de coordenador de futebol do Cruzeiro . Realizava o elo entre atletas, treinadores e diretoria. Também trabalhava na transição entre base e profissional. O argentino, nascido em Buenos Aires (no bairro de La Paternal) disse que gostaria de ficar no Cruzeiro , mas a distância da família pesou.
- Gostaria de ter essa continuidade no clube. Acredito que vai ser um ano melhor que esse ano. É pura e exclusivamente uma questão familiar. Passei o ano sem família, que viajou muito para Porto Alegre. O clube me deu essa possibilidade, porque meus três filhos ficaram lá. Tenho dois adolescentes e um menor, que foi quem mais que sofreu.
"Decisão exclusivamente familiar. Não vale à pena sem a família. É difícil, muito difícil. Expliquei ao Cruzeiro , e eles entenderam. Mas não poderia deixar de aprender num clube tão grande. Quando recebi a ligação do Ronaldo..."
D'Alessandro comemora vitória do Cruzeiro e celebra gol de jovem Robert
O jogador foi questionado sobre o futuro e abriu possibilidades.
- Eu gostei (ser coordenador de futebol), é uma coisa que eu continuaria fazendo. A longo prazo, não sei. Continuo sonhando com algumas coisas no futebol. Pode ser treinador, presidente... a gente não sabe. Futebol é uma arma muito grande. Às vezes, a gente não sabe o que significa o futebol. O futebol ainda me dá muitas coisas. Me gera tristeza e alegria. Esse ano foi muito marcante.
"Torcedor não sabe, mas a gente chorou muito. A gente se alegrou muito também em outros momentos. A gente fala com os atletas para curtirem, aproveitarem, porque o tempo passa"
Na entrevista à Globo, D’Alessandro também comentou sobre momentos críticos do Cruzeiro na temporada, como a discussão dos jogadores no vestiário da Arena do Jacaré, as trocas de treinadores e também a reta final de Brasileiro.
Leia o restante da entrevista:
- Primeiro, obviamente, quando terminei a carreira, tinha visão do que eu poderia fazer no futebol. Minha ideia era gerir pessoas. Pela minha carreira no Inter, a gente acaba fazendo isso com funcionários, pessoas do grupo, por ser mais velho, por ser mais experiente. No convite do Cruzeiro , não duvidei. Acredito muito em desafios. Para mim, foi um desafio. Pelo clube ter vindo da Série B, pelo sofrimento nos anos anteriores, pelas coisas aconteceram. Quando recebi o convite, a estrutura que o clube tem, porque é uma SAF, é diferente. Trabalhei em clubes políticos, numa associação. A SAF vem se introduzindo de forma mais forte. Eu embarquei, não tive dúvidas. Foi uma honra para mim. Não tenho história como atleta no Cruzeiro , e isso para mim deu muito mais valor ao convite. E outra coisa é que não tinha trabalhado na função, e o clube arriscou trazer um cara com experiência no futebol, mas como atleta, e não treinador. A SAF traz pessoas que podem agregar. Formar não só atletas, mas pessoas também. O Cruzeiro vai nessa linha.
Por questão familiar, D'Alessandro decide deixar o Cruzeiro
- Todo mundo chega cedo aqui (no Cruzeiro ). Chegamos cedo, 7h30, 08h, preparando tudo para os atletas. Fiz parte da coordenação do Sub-20 e profissional. Minha relação com o Fernando Seabra foi muito boa. As duas equipes trabalham no mesmo horário, trabalho integral. A gente consegue controlar a transição de jogadores. Saber o que a equipe principal precisa para um, dois dias antes, falar com o Sub-20 sobre os jogadores, para eles trabalharem com a equipe profissional. Reuniões com empresários também. O clube me deu essa possibilidade de trocar uma ideia, de explicar o momento do atleta, ouvi-los. Transição do Sub-17 para o profissional, saber que atleta do Sub-17 poderia fazer essa transição também. Diferente dos atletas do Sub-20, a gente aborda de forma diferente. Tem mais a ver com disciplina, conduta. A gente passa o que viveu, da nossa experiência.
"Não é só jogar futebol bonito, mas é também passar os valores, para ele chegar e ficar, ser constante (no profissional). A gente não quer que o atleta suba para o profissional e volte. Seria uma frustração para a gente e para o atleta também. Preparar o atleta para ele entender o futebol e chegar ao profissional, o mais próximo possível, como ser humano e atleta."
- Tive muitas reuniões com pais de atletas. Conheci do Robert, do Kaiki, que é uma família muito humilde e que me lembra dos meus tempos com meus pais. E pediam a mesma coisa: querem que o filho seja profissional, que tenha sucesso. E eu sentava e explicava a eles, o que o clube queria, planejava. É muito fácil colocar os meninos a qualquer momento, num momento difícil, e queimar eles. O que a gente não queria era isso. Queríamos poder explicar a eles que precisa estar quase pronto, porque acredito que não esteja. Se estiver, tem que estar no profissional. Numa evolução constante para chegar o mais próximo possível. Chegamos no fim do ano com dois jogadores que fomos levando aos poucos, que são o Robert e o Japa, que vinham mostrando evolução muito grande, e que as vezes, por momentos e contextos, vamos levando as coisas mais devagar, e a gente fica feliz por eles.
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D'Alessandro e Paulo Autuori Cruzeiro — Foto: Staff Images/ Cruzeiro
D'Alessandro e Paulo Autuori Cruzeiro — Foto: Staff Images/ Cruzeiro
- Tive o maior prazer de trabalhar, em me envolver num projeto tão importante. O Cruzeiro começou esse projeto ano passado. Conquistou a Série B de forma bem parecida. A gente não consegue separar do que vai acontecer no dia a dia, no fim de semana. O prazer existe, mas o sofrimento existe. A responsabilidade é muito grande. O dia a dia, o que trabalhei esse ano, foi um desafio: conhecer o grupo, os jogadores, o diretor, entrar no plano administrativo. Participar de negociações, dar opinião no Sub-20, no profissional. Reuniões com empresários, que o clube foi me dando possibilidades, abertura para prender. E isso fez com que eu pudesse, no decorrer do ano, aprender com Pedro Martins, sempre acompanhando ele. Sempre sendo elo entre a comissão, jogadores e diretoria. Poder estruturar categoria Sub-20, que vinha com continuidade de trabalho muito boa com o Fernando Seabra, mas que tinha sofrido por muito tempo. A gente correu atrás, conseguiu fazer. O Cruzeiro se estruturando não só com treinadores, jogadores, funcionários, um projeto que eu aprendi. Acredito muito nisso. Quero ser campeão na base, mas o mais importante é formar jogadores.
"Categorias de base tinham sido deixadas de lado, abandonadas. Quem sabe, quem vive o futebol, sabe que não dá para recuperar o trabalho em seis meses, um ano. É muito difícil"
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D'Alessandro e Ronaldo durante treino do Cruzeiro na Toca — Foto: Gustavo Aleixo/Cruzeiro
D'Alessandro e Ronaldo durante treino do Cruzeiro na Toca — Foto: Gustavo Aleixo/Cruzeiro
- Nossos últimos meses foram difíceis, foram complicados. Sei que para o torcedor, de repente, aceitar é difícil. O clube tentou explicar, mas eu entendo o torcedor. Torcedor é passional, quer ganhar. Cruzeiro é muito grande. Quando a gente está aqui dentro, a gente vê o quanto significa o clube. A repercussão de um jogo perdido, de uma semana difícil. A realidade, internamente, tínhamos claro que seria o ano difícil, complicado. Teve mudança muito grande no clube, resolveu mudar muita coisa da Série B para a Série A. Saíram 19 jogadores e chegaram 26. É muito difícil falar que vai dar certo, porque uma coisa é ter uma base, fazer a transição da Série B para a Série A, e contratar jogadores para agregar. Começamos um ano sem base, a partir daí é um trabalho do zero, com um treinador que vinha trabalhando. A gente sabia que precisaria de tempo, só que no futebol não há tempo. Futebol não te dá tempo. Precisa de resultado para ter tranquilidade. Resultado do Mineiro não foi o que esperávamos. Mas sabíamos que era um processo.
"Mercado foi evoluindo. No meio do ano, foi muito bom. A gente foi trabalhando em cima de coisas que estávamos convictos do que poderia acontecer. Aconteceu uma coisa, que não é ideia do clube, das mudanças (de treinadores). Não é o que o clube quer, mas o ponto positivo, nesse caso, é que o clube sempre arriscou para melhorar."
- Foi muito engraçado, e eu mal tinha chegado ao clube. Fomos para a semifinal do Mineiro, e aí teve essa situação do vestiário , que teve que intervir o treinador. E falei: estão me contratando para isso, não posso escolher momento. Mas acho que foi uma intervenção natural, que pensei que tinha fazer. Teve várias assim, porque é meu trabalho, mas sempre não passando do limite, sempre não passando do time, sem passar por cima do treinador, do capitão. É uma série de coisas que a gente tem que saber. As vezes dá para falar, às vezes não dá. Têm momentos. Isso foi aprendizado também.
América vence Cruzeiro e abre vantagem na semifinal do Mineiro
- Montagens de treinamento, mas mais participando, ouvindo, aprendendo. Participando caso eles precisassem. E, às vezes, eles falando que precisavam falar com determinado atleta, falava com o atleta, antecipava situações, prever problemas, que poderiam acontecer e não acontecer. O que deu, o que aconteceu, não acho bom agora, depois (de aposentar). Coisas que aconteciam comigo, de cabeça quente, e que não tinha gente com experiência para falar. Esse foi o dia a dia nosso. E muitas mais coisas que vão aparecendo no dia a dia, que temos dar um jeito de solucionar. Relações com outras áreas, que foi bom aprender, compartilhar momentos com atletas nas viagens. O mais importante na gestão é a confiança das pessoas.
- Vivemos situações, não só com o Gilberto. Situações normais, que a gente tem que lidar. Joguei com ele, tenho amizade com ele (Gilberto). Fiquei muito feliz de chegar ao Cruzeiro e ver jogadores que jogaram comigo. Isso encurta minha adaptação. Mas aconteceram várias coisas que a gente não externa. E isso é positivo no nosso clube. De repente, o torcedor não sabe o que o D’Alessandro fez. Torcedor precisa de informação, mas o importante é a diretoria e grupo de jogadores saberem o que a gente faz. A gente trabalhou bastante, trabalhou muito. No dia a dia para manter o grupo focado, jogadores mentalmente fortes. A minha relação com eles, acredito que tenha sido muito boa. Muita conversa, não invadir o lugar deles. Fui atleta e sei como é. Sei como abordar atleta, quando abordar.
"Do Gilberto, tentamos gerir da melhor maneira. Mas aqui há um objetivo claro: o clube. Fazemos gestão de pessoas olhando para o objetivo maior, que é o Cruzeiro . E no olho a olho. Acredito muito nisso. Acredito que tenha feito trabalho de formiga esse ano. Mas acredito que fizemos bem para chegar ao fim do ano com as coisas claras."
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Gilberto no Cruzeiro — Foto: Fernando Moreno/AGIF
Gilberto no Cruzeiro — Foto: Fernando Moreno/AGIF
- Positivo (balanço do ano). Tem a ver com a realidade que a gente viu. Joguei a Série B pelo Inter e subi com o Inter. O primeiro ano de retorno é fundamental para se manter. Quando você sobe, não só muda o elenco. Muda o contexto, a estrutura, um monte de coisas. O dia a dia, o torcedor não vê, mas muda muita coisa. Mas é positivo, porque eu fazendo avaliação rápida só um (que subiu em 2022) brigou pelo título: o Grêmio. Brigou pela Libertadores também. O Grêmio jogou a Série B com uma base profissional, com jogadores que tinham vencido no clube, que conheciam o clube, tinham uma história no clube. Ele manteve essa base e, depois, fez contratações pontuais. Isso encurtou o processo.
- Têm coisas que a gente leva em conta. Têm coisas que temos que melhorar? Claro que temos. Cruzeiro vai ter que melhorar para o ano que vem. Ano que vem vai ser mais fácil para orçamento, ter mais possibilidade. Mas era o ano que teria que passar. Na minha opinião, não era para chegar no final com tanto sofrimento para nós. Até por merecimento. Cruzeiro mereceu pontos a mais que teve. Deixamos escapar pontos que não merecíamos, mas também ganhamos jogos que não estivemos bem. Mas não merecíamos chegar à penúltima rodada dependendo de outros resultados.
"A gente merecia, pelo trabalho que o Cruzeiro , e os jogos do campeonato inteiro, ter seis pontos a mais, que estavam na mão e perdemos. Futebol não é matemática, tem muita coisa. No último terço do campeonato, fomos indo e conseguimos objetivos a curto prazo."
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D'Alessandro — Foto: Globo
D'Alessandro — Foto: Globo
- Só coisa boa (no futuro). É o meu desejo. O meu desejo é que o Cruzeiro continue crescendo. A SAF vem para quebrar culturas no futebol. Isso não é fácil. As pessoas que estão na SAF estão convencidas do que querem para o clube. Não é o desse ano, é muito maior. Mas é um processo que o clube tem que passar. O objetivo maior é esse. Mas formar atletas, pessoas, continuar crescendo como instituição, melhorar a estrutura. O futebol tem que continuar melhorando? Sim, mas a estrutura também. O clube tem tudo para continuar melhorando.
- Vou ser mais um cara que vai torcer para o bem do clube. Não vou falar como torcedor, porque torço para o Internacional. Sou um cara que vai torcer para o bem do clube, que saiu de uma situação e que vá melhorando ano após anos. A torcida me deixou impressionada. Sinceramente, quando a torcida do Cruzeiro quer, ela leva o time. E falar para o torcedor, agradecer pelo respeito, respeito na rua, quando encontrava o torcedor. As dúvidas sempre existiram, porque é normal, quer uma pessoa identificada com o clube. Mas é muito mais do que isso. A torcida pode querer alguém identificado, mas ter que ter capacidade para ir longe.